Hoje eu tomei uma decisão muito
importante. Eu sei que, à primeira vista, ela pode parecer precipitada ou
impulsiva, quiçá imatura, mas não se preocupe, meu bem, é algo em que venho
pensando há muito tempo. A decisão, inclusive, foi feita há tempos – porém, só
agora tomei coragem para pô-la em prática.
Veja bem, estou aqui agora, estática,
frente a esta pequena cova que cavei em meu próprio quintal e sinto que a ação
tomada já começa a surtir efeito. Não sinto dor nem sofro como provavelmente o
faria algum tempo atrás. Bem, acho que estou mentindo. Sinto muito, mas a dor é
grande demais para explicá-la. Além do mais, mentir faz parte do processo e
isso, alegro-me em dizer, foi algo para o qual não precisei me esforçar (mentir
tem sido uma ação frequente para mim, especialmente quando questionada sobre
meu estado).
De qualquer maneira, cá estou
encarando meu trabalho braçal e perguntando-me se não devia ter ido mais longe,
quem sabe para outro estado, para que os resquícios dessa loucura mantivessem-se
afastados, impedindo-me de uma recaída. A verdade, porém, é que não pude. Não
consegui, não pude, não questione! Ele ainda estava aqui quando a coragem me
tocou e lutou – muito! – por sua sobrevivência. Como nota, não conseguiu, mas
impôs tal condição com um desespero que nem mesmo a pior das criaturas poderia
negar. Confesso que minto novamente. O problema é justamente esse: não sou a pior
das criaturas, mesmo que o planeje ser. Sou sensível, volátil, facilmente
manipulável e ele sabia disso, por isso apelou. Maldito seja!, ouso amaldiçoá-lo.
Sim, pois quanto mais próxima, fresca, toda esta situação ainda estiver,
maiores são as chances de arrependimento. É claro que era essa sua intenção –
mas eu ainda acredito em minha força e sei que posso lutar contra sua ideologia
imbecil. Essa esperança foi, provavelmente, a única que restou em mim.
(Mentiras, mentiras e mais mentiras! Sua tola esperançosa!, seja sincera ao
menos uma vez na vida, eu quero que você fale a verdade na cara de todo mundo e
diga o que pensa sem mentir, pois a única mentira que contará será sobre o que
você sente toda noite quando está sozinha e ninguém está enganando esse coração
molenga e traiçoeiro que agora você joga fora nessa cova mal feita e cheia de
desespero. Eu quero que você grite, zombe, que você ria na cara dos outros e
mostre que tudo o que eles acreditam é uma mentira, que amar é besteira, sofrimento é psicológico – amar é psicológico! – e ser feliz é uma ilusão criada por um conto de fadas mal escrito! Eu
quero que você enxugue essas lágrimas e pare de sentir pena de si mesma, que
você se projete para o mundo sem achar que precisa de um homem para ser feliz,
sem se apaixonar pelo primeiro que disser que te acha linda só porque seus
problemas de autoestima são tão gritantes que é possível sentir o cheiro em um
raio de cinquenta quilômetros. Eu quero que você extrapole, que você corra
riscos, que se jogue de cabeça sem pensar até desistir! Eu quero que
você morra vivendo ao invés de viver morrendo, porque mais vale um coração de
pedra com toda sua força do que uma manteiga derretida que só sabe deixar
pedaços melecados nas mãos de quem o toca! Chega! Chega! Chega!)
Chega! Não tenho mais nada a lhe
explicar, meu bem, porque não quero mais seu bem. Quem queria está agora jogado
nesta cova no quintal de minha casa e assim que esses fantasmas me deixarem em
paz, será como se ele jamais houvesse existido.
Então, por favor, vá para o
inferno! E logo eu estarei melhor do que jamais estive. (Mentira?)